As portas do comboio abriram-se. Não sei exactamente como nem porquê. Muito menos para onde. Entrei. Limitei-me a entrar.
Segui o corredor. Sempre a direito, sem vacilar. Nem os balanços, me fizeram vacilar.
Passei as portas todas. De um para outro vagão, desertos de coisa alguma. Estanquei na última, já a debruçar-se pelo horizonte.
E sentei-me. De frente para o passado, que rodava num entusiasmo frenético, um balanço, um balanço…
Sem querer saber, adormeci.
O sonho não o vivi . Ou não me lembro, não sei.
Quando acordei, encarei de frente o mesmo cenário. E foi então que percebi. A viagem estava ali à minha frente.
Feita de passos dados, de sorrisos sorridos, de gentes que nunca voltam.
Sentada ao meu lado, aconchegada entre o vidro dessa última janela, na derradeira carruagem, viajava de branco…
Perguntei-lhe o nome.
Disse-me chamar-se memória...
(a fotografia é do fotógrafo Mário Castello)
(a fotografia é do fotógrafo Mário Castello)
«Com esta escrita descobri uma coisa em que nunca tinha pensado, é que o bem mais precioso do homem é a memória.»
ResponderEliminarJosé Cardoso Pires
Descobri recentemente a exactidão desta frase, pelo que é assustador uma memória em branco. Se bem que o branco reflecte todas os raios e é a junção de todas as cores, logo terá viajado muito bem acompanhada.
Again, very nice and so poetic...a bit neurastenic...but though excellent
ResponderEliminarVMM Souza,
ResponderEliminarUma viagem ao passado, de memória errante e em branco. por isso soa assim. Obrigada
Paulo A.L,
Uma memória em branco e os carris cruzados.(da fotografia).
Obrigada
George Sand,
ResponderEliminarFluir entre os vidros do comboio e a presença estática das linhas cruzadas resulta em memórias lentas e vagas.
Ana,
ResponderEliminarGostei muito dessa leitura.Os carris cruzados foram propositadas.
bela prosa; ainda bem, revela a calma de espírito, pelo menos do espírito da memória.
ResponderEliminarabraço
Obrigada João.
ResponderEliminarEspírito da memória...bela frase!