domingo, 17 de maio de 2015

Mar desfolhado




Em cada onda desfolhei um ano, de todos os anos do meu passado.
Primeiro com força, de encontro às rochas. Anos de infância de que pouco recordo. Depois, mais mansamente, em páginas reviradas em lençol de areia.
De sete em sete ondas, lembrei-me de parar um pouco a existência, à espera de um sopro, que me viesse amarar, eternamente, a este lugar…
Pespontada a infinito, restará para sempre a transparência…do céu que se faz mar.

A fotografia é do Pedro Soares de Mello

sábado, 9 de maio de 2015

Recta absoluta


Devagarinho, acomodou-se ao nicho.
As pernas de encontro ao queixo, no único lugar que lhe permitiria permanecer, até que a luz, o invadisse de novo.
Toda a noite as badaladas ecoaram um sibilante: tzim tzum, tzim tzum, tzim tzum sem que uma única fresta lhe traçasse caminho.
Seria qualquer um, menos a o da escuridão. Tizm tzum, tzim tzum, tzimtzum…
Adormeceu algures, entre a terra, o seu coração e a eternidade, embalado pela branda presença do som, que lhe lembrava um outro amanhecer .
Quando acordou reparou que a única porta fechada, lhe estendia uma recta absoluta. Com os olhos semiabertos, decidiu-se então,  a andar…


A fotografia é do Luís Leal