segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

Existência, num murmúrio, do fundo do seu coração

 


Desenhou uma espiral na entrada da casa, a afunilar, directamente, à estrada do pensamento. 
Não se percebia muito bem da porta, quantos passos se teria que dar, para se ultrapassar toda a realidade, rodar a maçaneta aos sonhos e, desembocar numa passadeira, sem vivalma.
Mandava então parar o tempo, aquietar bem o espaço e seguia.
A viagem era sempre a da existência. Sem destino muito preciso e sem direcção definida. 
Guiava-o vagamente, uma pequena bússola  que herdara do seu avô. E, um marcador de passos, amarelado, de vitrine partida e ponteiros seguros por um elástico que lhe permitia, mesmo assim, contar e  recontar a vida, segundo a segundo, por uma boa parte da eternidade.
Todos os dias percorria sozinho uma boa parte da eternidade. 
Não havia nenhuma esperança nem contemplação, na viagem. 
As bermas pareciam inertes e a paisagem, permanentemente indefinida. 
Depois de horas a repensar o que o levara, passava outras tantas a ensimesmar-se  sobre o que o traria.
Ainda hesitou, por um único dia, desviar-se. A causa, foi um pequeno murmúrio que pareceu ouvir, do fundo do seu coração

Filipa Vera Jardim 


Imagem: Quadro do pintor Artur do Cruzeiro Seixas. 




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