segunda-feira, 18 de novembro de 2024

Casa de Conchas de Lília Tavares

 

Escreve ainda o teu nome na minha mão.
Se um dia a juventude voltasse,  
libertava-me do que não faz falta ao luar,
convocava a tua e a minha pele para a luz. 

sobre as ervas não lamento estar só.
É das flores o corpo semente água
seiva taça uvas mares apelo
seio rebentação ternura inacabada. 

Aquieto-me sedenta, ergo me sôfrega
e espero a água da tua boca, céu
de anis estrelado que me condena

à sede eterna de todos os bálsamos. 

Viajamos assim entre palavras, sentimentos e a memória dos espaços bem desenhados na poesia da Lília Tavares 
É pictórica esta viagem,  um cenário com o mar e o vento como companheiros quase inseparáveis. Lá, num lugar que se faz presença em todas a idades. Parte-se assim mesmo :  habitado! Pela figura materna, por um pássaro,  por " peixes azuis a desistir de respirar". "Os peixes azuis e acesos dos teus olhos" que nos fazem intercalar as palavras e os lugares,  as palavras e  o vento,  as palavras e  as sombras . As palavras

 (...)que ainda ressoam no amago do coração.
Fico arrepiada por saber que em  breve te vais
confundir com as calçadas, nevoeiros
de onde apetece trazer-te. 
Para mim.

É o apelo da natureza  que se mistura à memória  para nos fazer respirar o momento,  por entre as estrofes, a sorrir-se às pessoas, a enlevar-se, a querer que o passado não se vá  assim de repente, a querer que o amanhã tenha  sempre vontade de surgir 


Chega setembro para outonar os sonhos
Ainda achamos cintilações em pequenos gestos
e damos vida a pétalas limpas nas manhãs (...) 


É assim esta Casa das Conchas, com espaço para que cheguem, revisitem, para que se encontrem.
Precisam-se de muitos actores,  gente  que se demore.

(...) Escrevo chuva e demoro -me inteira sob os beirais das casas.
líquida, estonteada (...)

Demoram-se em lugares desertos, 
num vale sombrio de árvores soturnas.
Mulheres amputadas, coartadas do desejo.
Não encontram espaço na matriz do prazer.
Beberam o leite escasso e triste das mães
a cobrir de espesso escuro o bater do coração.
Abrem as janelas. Só elas e a noite. 


Obrigada Lília por esta viagem através das tuas palavras embrulhadas em azul, como (...) o mar que guardas nos bolsos

Filipa Vera Jardim 


  


Sem comentários:

Enviar um comentário