Não iria ser poeta. Jamais iria ser poeta.
O tempo das palavras delirantes, angustiadas, desarvoradas, arrumadas por linhas e linhas de angústia e sofrimento, não faria sentido...faria com que não fizesse sentido.
Uma boa noite de sono. E as palavras surgiriam tão serenas como os dias. Ou muito mais serenas, ainda, do que os dias. Numa constância de parágrafos desassombrados, ao encontro de enredos mais ou menos expectáveis.
Não, não iria nunca ser poeta. Passar o tempo a semear palavras que depois exigiriam monda e regadio.
Dias e dias de emoções, a gear em cima de estrofes. De chuvas de medos, torrenciais, a derrubar rimas. De seca...de seca...de seca...num movimento ritmado do pó do tempo, que abafa a memória e deixa a história quase toda por contar...
Não não iria ser poeta. Os dias sofridos em substantivo. As noites passadas em verbo...
Respirou suavemente, todas as sílabas de que se lembrou. Que transportavam um ar puro, levezinho.
Encostou-as à janela e deixou-se escorregar para um sono sem memória
De manhã, não se lembraria de nada...