Desenhou uma espiral na entrada da casa, a afunilar, directamente, à estrada do pensamento.
Não se percebia muito bem da porta, quantos passos se teria que dar, para se ultrapassar toda a realidade, rodar a maçaneta aos sonhos e, desembocar numa passadeira, sem vivalma.
Mandava então parar o tempo, aquietar bem o espaço e seguia.
A viagem era sempre a da existência. Sem destino muito preciso e sem direcção definida.
Guiava-o vagamente, uma pequena bússola que herdara do seu avô. E, um marcador de passos, amarelado, de vitrine partida e ponteiros seguros por um elástico que lhe permitia, mesmo assim, contar e recontar a vida, segundo a segundo, por uma boa parte da eternidade.
Todos os dias percorria sozinho uma boa parte da eternidade.
Não havia nenhuma esperança nem contemplação, na viagem.
As bermas pareciam inertes e a paisagem, permanentemente indefinida.
Depois de horas a repensar o que o levara, passava outras tantas a ensimesmar-se sobre o que o traria.
Ainda hesitou, por um único dia, desviar-se. A causa, foi um pequeno murmúrio que pareceu ouvir, do fundo do seu coração
Filipa Vera Jardim
Imagem: Quadro do pintor Artur do Cruzeiro Seixas.