segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020
Flor
Flor foi a sílaba que escolheste para me oferecer na primeira noite que passei encostada ao teu umbral.
É uma sílaba plena, disseste-me. Sozinha transporta com ela o cheiro intenso de um cravo, a beleza de uma gardénia que se embebeda de sol. Uma única sílaba e contém em si toda a simetria do universo, nunca a percas, pode ser o início de um grande e belo poema.
Peguei na sílaba flor e metia-a no bolso.
Reparei qu8e me olhava estupefacto.
-No bolso? Meteste a sílaba flor no bolso?
Envergonhado, retirei-a já um pouco amachucada. Pegaste nela e com todo o cuidado começaste a alisar -lhe a parte de cima do F, a ajustar o L, a contornar com força o O, a endireitar o R...
- Se não cuidas dela, ela vai-se. E depois, como consegues tu dizer que algum pássaro algum dia lhe pousou? Como podes tu dizer que alguma amontanha se vestiu dela? Que alguém a colheu ao passar...É impossível imaginar uma série infinita de poemas sem uma flor.
Sem uma única sílaba e o universo poderia ficar irremediavelmente coxo.
Imagem: "Mulher-flor " de Pablo Picasso
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