segunda-feira, 4 de junho de 2012

Lágrimas de sais aflitos




Aconteceu-lhe ter que partir, num remoinho de vida.
Partir entre esgares de medo. Partir com dolorosa saudade. Partir desfeito de si, em lamentos mais ou menos imprecisos, sem nunca olhar para trás.
Para o lugar largado, para a pessoa perdida, para o cenário apagado.
Partir em passos largos e gestos brandos, de quem não sabe se algum dia chegará...

Aprendeu cedo, a distinguir as lágrimas da partida, feitas de sais aflitos, das da chegada, aninhadas à quase felicidade.
Mas ali,  nunca lhe acontecia chegar.
As partidas prolongavam-se em metros e metros de passadeiras, de escadas, para cima, da vida. Para lá, da vida, Ultrapassando a mera existências. Simplesmente...iam.
E continuavam a ir. De costas voltadas aos tempos dos sorrisos, que conseguia, não obstante, entrever, por entre portas.

até ao dia, em que prometeu a si mesmo que tomaria atrás de si, um café. Por entre essas portas...
Desceu a rampa, sentou-se, do outro lado do aeroporto. Pegou numa rosa. Das tantas que acompanham unicamente, chegadas.
E, foi ficando por ali, entre pétalas e abraços.
Lágrimas de outros sais, inundavam-lhe de espanto, o rosto. Dessas, aninhadas à quase felicidade...
Sabia que a partir desse dia, viveria sempre assim: a partir da porta de desembarque.





20 comentários:

  1. Chorei essa lágrimas de partida há já muitos anos (17).
    Como eu estava engando!!
    Bjs e votos de boa semana

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  2. Boa semana Luís Coimbra.
    Lágrimas baralhadas... Acontece tanto a vida
    bj

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  3. Belo, muito belo. Como já me habitou a não esperar outra coisa.
    E, et pour cause... prefiro partir. Não gosto tanto de regressos, vivo mais em " viagem " permanente, minha ou de outros que imagino.

    Devíamos poder regressar só ao que pudéssemos escolher...

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    1. Fernando Antolin,

      Grande a coragem de viver em partida permanente, onde as lágrimas, se engolem tantas vezes à pressa...melhores os regressos escolhidos.
      Se fosse assim a viagem, seria serena, a vida.
      Obrigada

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  4. Na partida há o apelo do desconhecido muitas vezes associado à lágrima que se tenta conter.Perdi muitas vezes a felicidade da chegada antevendo a curto prazo a dor das lágrimas de sais numa partida breve.
    Quando ainda o velhinho Carvalho Araújo fazia a viagem Lisboa/Açores,depois substituído pelos modernos Angra e Funchal,lembro um desembarque com um pássaro que sobreviveu tranquilamente ao cuidado de um camaroteiro deligente...rsrs.É claro que essa alegria durou pouco, porque as férias passavam depressa e os meses seguintes passavam muito devagar.Sem querer soltaram-se algumas memórias!
    Bj com votos de uma boa semana

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    1. Concha,

      Hesitei na imagem que acompanharia este texto...os balões coloridos, de viagens com retorno. Ou os sais, das lágrima imensas, da lagoa das sete cidades, que nunca refunde de verde do azul.
      Ainda bem que se soltam memórias.
      Bj e uma boa semana

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  5. As lágrimas da partida são bem diferentes das da chegada!!
    Os sentimentos são opostos!

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    1. Pois são. Por isso a personagem preferiu passar a partir, sempre, da porta de desembarque. Já que a vida é uma viagem inevitável, que se faça com sorrisos e flores.:)
      Obrigada

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  6. Prontíssima a partir para outros (altos) voos, sem deixar lágrimas, que não as da felicidade que podes gerar. Parabéns, Filipa.

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  7. lugar de utopia - sem partida, nem chegada!

    ... oi síntese de lágrimas, não sei bem!

    belíssimo texto. sem dúvida.

    beijo

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    1. Ou a inconstância, entre a partida e cegada, numa viagem de vida que não nos permite, quase nunca, a simples permanência.
      Obrigada,
      Bj

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  8. Desejo um constante partir. A estadia torna-se sempre uma rotina difícil, aí sim as lágrimas são de sais.
    Beijinho.

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    1. E duro partir sempre Ana. Por vezes em viagens sem destino concreto...mas não há rotina, isso não.
      Bj e obrigada

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  9. Na partida temo o abrupto, assim como eu concedo quando viro as costas um ultimo olhar, um último cruzar de olhares, também espero quando vão, que a meio da recta estanquem, rodem os pés e uma vez mais me olhem para partir, num adeus, num ate já,

    quando regresso, quando regressam não me importo com tais pormenores estéticos, com tais cautelas de sensações simplesmente aceito o que flui como o mais natural, o mais correcto, aquilo que é suposto rasgar minhas veias e artérias,

    cumprimentos,
    JD

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    1. São tão raros os que estancam a meio da recta e, nos olham, na partida Dillon.
      E um regresso fluido, em que quase sempre as emoções se atropelam.
      Boas as viagens.
      Obrigada e Cumprimentos

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  10. A elegância é coisa estética, a emoção é coisa química. A Filipa conjuga as duas com maestria.

    Sou de partidas, mas de viagem olho sempre para trás. E nem sempre em busca da chegada, mas na melhor forma de seguir e partir.

    Beijinho

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    1. É bom levar as emoções, na viagem.
      Pelo menos as emoções. E olhar pata trás. Muitas vezes, é atrás que estão as indicações, das melhores rotas.
      bejinho Paulo e obrigada

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  11. Depende da partida de quem parte...!
    Há partidas que me provocam lágrimas mas há chegadas que também as provocam!
    Conheço melhor as emoções fortes de partidas sem regresso e essas é que me modificaram... e me criaram uma certa indiferença levando todas as minhas emoções.
    Hoje não me emocionam partidas ou chegadas.
    Poucos sentimentos me emocionam...
    E sabes George Sand... nunca olho para trás, porque se olhar ainda sou capaz de ver... o que não quero!
    Abraço

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    1. Temos sempre muitas partidas sem regresso...
      E olhar para trás por vezes é duro.
      Bj e obrigada

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