quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Trans-pareces-me



Escreveste...
Escrevi!
A traços negros, a pousarem-te os olhos nas curvas apressadas do meu corpo.
Vertigem descompassada de um beijo surpreso e, rodado nos lábios. Firmemente rodado,  numa vertigem.
Escreveste mesmo...
Escrevi!
E os teus olhos,  a obrigarem-me a desejar sequer ter escrito.
Uma página a menos, agora invertidamente carimbada, no lençol debaixo, da minha e da tua existência. Faria diferença? Faria assim tanta diferença?
-Quantas sílabas escreveste tu?
Duas, apenas. Uma para te dizer que sim. Outra para te fazer esquecer...

Nunca tinha visto esse pássaro que transportava no bico uma borracha. Aproximou-se do parapeito e pouco a pouco, retirou a tinta de todas as penas.
Antes de partir, deixou cair a borracha. Não haveria mais cores, nem mais assombros.
Nenhuma paisagem desalinhada no horizonte da nossa memória.
Levantou voo sem ruído e, levou consigo, toda a tua transparência.

14 comentários:

  1. Hoje estou a conseguir comentar.
    Depois de ler mais este seu texto, deixe-me tentar adivinhar uma coisa - é fã de Garcia Marquez, provavelmente o seu autor favorito.
    Acertei?

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  2. Pedro Coimbra,

    Hoje a coisa vai...mas também tenho dificuldades muitas vezes Pedro. Este Blogger não nos facilita sempre a vida
    Gosto do Garcia Marquez sim, mas não posso dizer que seja o meu autor favorito.
    É difícil falar num autor favorito...mas nessa "esfera" escolheria Vargas Lhosa. Ou,a poesia de Benedetti e de Jorge Luis Borges. E algumas coisa de Garcia Marquez evidentemente. Tem dias...:)

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  3. Pois é, a transparência desassombra. Mas será que afasta, que desinteressa? Responda-me, Filipa. O enigmático e bonito texto é todo seu.

    Jorge Luís Borges, sempre.

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  4. O ego e o alter ego num diálogo brilhante e lúcido.
    O querer e o não querer lindamente tratados...!

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  5. Paulo A L,

    A transparência pode ser como um vestido d'alma. Há transparências que afastam. Outras, que nos procuram e, nos fazem chamar um bando de estranhos pássaros, que desvendam silêncios e palavras.
    Tudo o que eu publico, sem referência bibliográfica é meu, sim.
    Borges: siempre! :)


    mfc,

    Uma abordagem psicológica, sim. Ego e alter Ego,nas margens da memória.
    Obrigada

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  6. Nem todos os pássaros são de cristal

    para nos fazer voar
    num diálogo de penas

    Belo texto
    Bj

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  7. Uma escrita em busca da transparência...
    Muito bom!

    Beijo :)

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  8. Gostaria por vezes de ter a habilidade desse pássaro :)

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  9. Mar Arável,

    (este pseudónimo lembra-me sempre um quadro de Van Gogh...em pinceladas de azul e movimentos de girassol)
    Bom que voemos num diálogo interior, Obrigada

    AC,

    Uma escrita em busca de transparência e uma transparência, que se desvenda em palavras.
    Obrigada

    Luísa,

    Era não era? Para isso servem as palavras: para nos fazerem voar... :)

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  10. George Sand,
    Muito bela esta transparência. Parabéns!
    :)

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  11. Obrigada Daniel

    Ana,

    Obrigada. Ainda bem que gostou

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  12. Um registo fantástico, numa dualidade cheia de cumplicidades. Um Xi Filipa.

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  13. Obrigada Cândida.
    Vamos lá ver se saem cartas...Bj

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