III
Silêncio
Minha memória,
Recebo quase tudo. Em catadupa.
Os natais que me mandas aos pares. Com enfeites escolhidos
criteriosamente, nos anos felizes. Chegam ainda com os laços da alma e
os nós da festa por desatar. Porque todas as festas têm nós. Às vezes
desatam-se e outras vezes permanecem...
Também recebo muita gente. Gente que não esqueço. Empacotada esmerada mente em sorrisos que se
acotovelam à minha existência e, me vão fazendo cócegas por cima de
tudo, do que já me habituei a reaprender. Vezes e vezes sem conta.
Não sei se já te disse, mas esses envelopes de alma, em que me remetes a vida, cheiram a lavanda.
E os selos especiais de girassois...Chegam exaustos. De pescoços
torcidos, nas voltas e reviravoltas do correio. Mas sempre carimbados de
sol.
um dia vou tirá-los cuidadosamente com uma pinça, dentro de uma bacia de
água, como fazia o meu avô. Nos tempos em que já era dono de uma grande
parte de ti, memória. Para os colar, quem sabe, num futuro...
Recebo tudo, como te digo, mas não recebo nem as ausências, nem as pausas, sobretudo os silêncios.
O que fizeste com esse tempo de respiração, eu não sei...
Mas se não me mandas os meus silêncios de vida, pode ser que nunca mais
consiga desabotoar a imaginação, que me retempera os dias.
Há muito barulho aqui. Demasiado barulho e pouca ausência. Por mais que procure...
Eu sei que havia silêncios. Muitos silêncios. Ausências...um fio de vento que me percorria os dedos, a murmurar paisagens.
Encontro alguns, mas não todos.
manda-mos. Saberei escolher os necessários, para continuar.
Até sempre memória.
F.V.J.
(este texto foi escrito originariamente para o blogue Cartas aos mollhos (Palavras aos folhos) )
(a imagem foi tirada da net)
(a imagem foi tirada da net)
Os silêncios! E silêncio também é música, talvez por isso façam tanta falta. Um espaço para ouvir a alma, as batidas do coração.
ResponderEliminarBj
Olinda
Olinda,
ResponderEliminarFazem muita falta. Sem eles não temos nem música nem diálogo, nem espaço interior.
Obrigada,
Bj
A memória das memórias
ResponderEliminarpara que existam amanhãs recriados
Bj
O silêncio pode ser muito repousante mas também pode ser inquietante.
ResponderEliminarQuando as memórias são boas desenrolam-se como um papagaio que voa ao vento, no silêncio. Todavia, há sempre o oposto e, nele, as memórias são tristeza e dor... e nesses silêncios os relógios param.
Porém, há algo de muito bom no silêncio é que se pode ouvir um nocturno de Chopin!
Beijinho e parabéns pelo excelente texto.
George Sand,
ResponderEliminarSem esses silêncios, esses momentos de recolhimento, na companhia de um bom livro, de um bom filme, de um bom disco, não há memória que resista.
Mar Arável,
ResponderEliminarMemórias em construção...gostei.
Obrigada,
Bj
Ana,
Tenho Chopin sempre dentro das memórias. E, quando não tenho, serve-me para preencher silêncios.
Obrigada,
Bj
Pedro Coimbra,
É preciso espaço sim. Para deixar respirar as palavras. Ontem por acaso, foi dia de um bom filme...a pedir memórias.
Hoje foi um dia em que senti falta de silêncio :) Não deste silêncio revelador de memórias mas só de silêncio repousante.
ResponderEliminarLuísa,
ResponderEliminarSilêncio que tanta falta, também a mim me faz. Este fim de semana, sem falta.
Bj